Conheça a mais abrangente iniciativa de cartografia social já realizada na Bocaina. Protagonizada pelas próprias comunidades, caracterização envolve territórios indígenas, quilombolas e caiçaras de Angra dos Reis (RJ), Paraty (RJ) e Ubatuba (SP)
Qual é exatamente o território tradicional reivindicado para titulação pelos quilombolas? Quais são as demandas de saneamento dos indígenas? E quais são as aspirações dos caiçaras em relação ao acesso à educação? Estas são apenas algumas das informações que serão reveladas pelo Projeto Povos, iniciativa que vai colocar de vez, no mapa do Brasil, os territórios, identidades e tradições de 64 comunidades tradicionais indígenas, caiçaras e quilombolas de Angra dos Reis (RJ), Paraty (RJ) e Ubatuba (SP).
Reivindicação histórica do Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT), a realização do Projeto Povos é uma medida de mitigação exigida pelo IBAMA, no âmbito do licenciamento ambiental federal, da atividade de produção de petróleo e gás da Petrobras no Polo Pré-Sal. Quem executa é o Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS), uma parceria de dez anos entre o FCT e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), maior instituição de pesquisa em ciência e tecnologia em saúde da América Latina.
Participam também a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), a Comissão Guarani Yvyrupá (CGY) e a Coordenação Nacional de Comunidades Tradicionais Caiçaras (CNCTC), que completam o conselho do projeto com a missão de garantir que todos os direitos das comunidades sejam respeitados.
Protagonismo comunitário
Diferente de outros projetos deste tipo, - que são feitos apenas por empresas, universidades ou ONGs -, no Projeto Povos o protagonismo é das comunidades tradicionais. Isso foi uma exigência do próprio IBAMA, que pautou a participação do Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT) no envolvimento com todo o processo. Até 2023, serão 64 comunidades tradicionais caracterizadas: 48 caiçaras, 8 quilombolas e 8 indígenas.
“Estamos entre as duas maiores metrópoles do Brasil, Rio de Janeiro e São Paulo, em uma região que está hoje no olho do furacão do Brasil. Por isso esse projeto é tão importante, porque somos nós, comunidades tradicionais, que diremos em que situação estamos e o que nós de fato queremos”, destaca Vagner do Nascimento, Coordenador do FCT, Coordenador Geral do OTSS e morador do Quilombo do Campinho.
Para isso, o projeto levantará a situação atual e as demandas das comunidades em relação a temas como saúde, educação, saneamento, situação fundiária do território, práticas culturais, festas populares, trabalho e renda, segurança alimentar, modos de governança e outros temas escolhidos livremente pelas comunidades.
Outro objetivo do projeto será avaliar os impactos da exploração de petróleo na Bacia de Santos sobre os territórios tradicionais destes três municípios. “As comunidades tradicionais durante muito tempo foram invisíveis, não eram reconhecidas, não eram vistas e muitas ainda não são. Por isso, fazer um projeto de caracterização significa criar um instrumento de luta para as comunidades por direitos e políticas públicas”, argumenta Adriana Lima, representante da Coordenação Nacional de Comunidades Tradicionais Caiçaras (CNCTC).
Entre outras ações, o Projeto Povos realizará mais de 40 oficinas de caracterização e 10 partilhas temáticas para trocar conhecimentos nas áreas de agroecologia, saneamento ecológico, educação diferenciada e turismo de base comunitária. Também serão produzidas, em linguagem simples e acessível, 15 publicações impressas, 55 vídeos curtos e 2 videodocumentários com temas definidos pelas próprias comunidades.
Fortalecimento das comunidades
O Projeto Povos não assegura que haverá titulação, demarcação ou regularização fundiária de territórios tradicionais, mas garante que as reivindicações das comunidades chegarão aos órgãos competentes responsáveis por fazer isso. Do mesmo modo, o projeto não construirá infraestruturas nas comunidades. Mas levará ao conhecimento dos governos e órgãos públicos quais são a situação atual e as demandas de cada território em relação a serviços e equipamentos públicos nas áreas de educação, saúde, saneamento e trabalho e renda, entre outras decididas pelas próprias comunidades.
“Território para falar de onde vivemos. Tradição para falar de quem somos. E identidade para falar como nos expressamos em nossas culturas como indígenas, caiçaras e quilombolas. Eu acredito muito nesse projeto porque as comunidades é que vão dizer como elas são”, completa Julio Caray, articulador do FCT e da Comissão Guarani Yvyrupá (CGY).
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