Diversidade de público e a presença de movimentos sociais de diversos lugares do Brasil se reúnem em busca de fortalecer a agroecologia como ferramenta de garantia da saúde pública e coletiva
Quando se fala de promoção da saúde, poucas pessoas associam que essa prática deve estar relacionada diretamente com o que chega à mesa da população. A relação da qualidade da alimentação incide diretamente nos indicadores de saúde e há um esforço de diversas redes e articulações para convergir os diálogos na construção de territórios saudáveis em busca da promoção do bem viver e da agroecologia.
Em meio a essa pauta e caminhando para a construção de um encontro que irá reunir experiências nacionais na promoção da saúde e da agroecologia, o “Mentes Abertas & Corações Pulsantes”, realizado no Colégio Cembra em Paraty no dia 17 de agosto teve como tema: "Saúde e Agroecologia: diálogos possíveis na construção de territórios saudáveis". Cerca de 50 pessoas estiveram reunidas, entre elas, agricultoras e agricultores, estudantes, colaboradores da equipe do OTSS e lideranças do FCT junto com representantes da Fiocruz, da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).
Seguindo o formato de roda de conversa, o encontro contou, especialmente com a mediação de André Campos Búrigo da Escola Nacional de Saúde Pública e de Paulo Peterson, da Secretaria Executiva da ANA e da AS-PTA - Agricultura Familiar. Ambos abriram o encontro falando sobre o histórico da luta pela garantia de um alimento saudável e justo na mesa da população brasileira, essa relação com a saúde pública e a necessidade da criação de redes para que seja cada vez mais consolidado o olhar sobre a agroecologia contraponto o modelo hegemônico do agronegócio junto à grande mídia.
A luta pela garantia da segurança e soberania alimentar
“O debate de saúde e agricultura, a importância das questões ambientais para a saúde é um debate muito longo e antigo no Brasil. O médico Josué de Castro, na década de 40, após formar-se em medicina percebeu que estava enxugando gelo, ou seja tratando das consequências dos problemas, do adoecimento das pessoas e viu que não era ali que se resolvia as questões”, conta Campos. Segundo ele, essa investigação da relação entre a alimentação e saúde e começa a pesquisar sobre a questão da fome, percorrendo regiões do Brasil e documentando gerou como produto um dos seus livros mais famosos, chamado Biografia da Fome.
“Algumas verdades são propagadas pela grande mídia na sociedade. Dizem que sem transgênicos e agrotóxicos não é possível alimentar a população e temos que dar uma resposta porque isso não é verdade. O agronegócio não alimenta a população nem em quantidade, nem em qualidade, muito menos em diversidade”, destaca Paulo Petersen. Ele também salienta que hoje, no mundo inteiro, apenas três grandes espécies alimentam mais de 50% da população - o trigo, o milho e o arroz.
A roda de conversa evidenciou, sobretudo, a importância da compreensão de agroecologia como um sistema alimentar, que tem início no plantio e escolha das sementes e que chega até a mesa do consumidor, influenciando diretamente saúde e no bem viver. “Atualmente 57% da população brasileira encontra-se com excesso de peso e 20,8% têm obesidade. O custo global da obesidade para o sistema de saúde é de quase 500 milhões de reais por ano e nós vivemos hoje um sistema alimentar extremamente adoecedor. Quando falamos das experiências agroecológicas estamos falando de uma alimentação cheia de biodiversidade, que integra as plantas medicinais, a medicina dos povos e comunidades tradicionais”, discorre André Campos Búrigo.
Combater a doença, promovendo saúde e bem viver
“A agroecologia se trata da agricultura a partir do encontro dos ecossistemas, conectando a agricultura na natureza e na sociedade, de quem consome, o que é consumido, em que padrão, que cultura”, explica Petersen. O ativista que luta nessa defesa há muitos anos afirma que hoje as pessoas se alimentam do que é imposto. “É preciso entender que a saúde não é a ausência de doença, é um estado pleno individual e coletivo e a agroecologia é uma estratégia de promoção da saúde com enfoque ecossistêmico”, completa.
“É de grande importância que os profissionais da saúde cheguem cada vez mais junto na luta da agroecologia para que possamos articular uma grande rede, porque os impactos tanto positivos quanto negativos aparecem muito rápido”, salienta Búrigo. O especialista alerta que é necessário uma regressão crítica sobre esse modelo de agricultura industrial, e que desde as conferências ambientais da década de 90 fala-se de maneira explícita sobre o combate aos agrotóxicos.
“Infelizmente, ao passar esses anos todos, o consumo de agrotóxicos só aumenta em nosso país. Não basta só denunciar, temos que ampliar o diálogo nessa área e uma segunda tarefa é produzir políticas públicas e ações que enfrentem esses impactos contra os agrotóxicos. Temos que aperfeiçoar, conseguir dar acesso de saúde às populações rurais, e expor os impactos dos agrotóxicos na comida. Essas são as estratégias reais de alternativas.É desse encontro que vamos construir territórios sustentáveis e saudáveis”, completa André Campos Búrigo.
Redes e encontro: caminhos possíveis nessa construção
“Cabe no campo da saúde pública e coletiva a nós construir uma agenda de pesquisa e investigação que permita olhar com mais precisão sobre a magnitude e assim contribuir com a sociedade para saber os impactos desse modelo de agricultura”, destaca Búrigo. Ele integra a equipe da Fiocruz que está construindo o “Encontro de Diálogos e Convergências: Saúde e Agroecologia”, como forma de ampliar essa discussão no campo da saúde dentro e fora da instituição, junto a uma rede consolidada de parceiros.
“Somos membros da natureza, seres sociais, ou seja, para promover a saúde precisamos estar conectados na natureza e na sociedade, se não perdemos a capacidade de promover esse ambiente”, finaliza Petersen.
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